Mãos nas mãos, olhos nos olhos, protocolo é isto e algo mais
20.10.2007, Clara Viana
O protocolo pode ser uma mensagem de não agressão, tão natural como o acto de se vestir de manhã. Vários dos seus preceitos ajudam também a evitar situações embaraçosas
1. Não responder a um convite que pede expressamente R.S.F.F (responda se faz favor)
2.Não começar por cumprimentar quem o convidou ou sair sem se despedir dos donos da casa.
3.Ignorar o código de vestuário mencionado no convite.
4.Falar aos gritos para alguém que está noutro canto da sala
5.Esquecer-se de levar os seus cartões de visita para eventos empresariais
Isabel Amaral, ex-assessora de Cavaco Silva, responsável pela pós-graduação em Imagem, Protocolo e Organização de Eventos, no ISLA, autora dos livros "Imagem e Sucesso" e "Imagem e Internacionalização"
1.Escolha o restaurante adequado: se for o de um hotel de cinco estrelas não correrá qualquer risco de ser criticado.
2.Chegue a horas. Ou melhor: se for o convidante, chegue cinco minutos mais cedo; se for o convidado, pode chegar cinco minutos mais tarde.
3.Não entre a matar. Faça alguma conversa mole e não trate de negócios antes de escolher o que vai comer.
4.Não fale demais e não coma (mas sobretudo não beba) demais. Faça ambas as coisas com conta, peso e medida - permitindo que o seu interlocutor também fale e também coma.
5.Dê toda a atenção ao(s) seu(s) companheiro(s) de mesa - e não passe o tempo a preocupar-se com quem entra ou está sentado nas outras mesas. Sobretudo: não se levante para ir cumprimentar alguém que não está na sua mesa, deixando o seu convidado, ou quem o convidou, sozinho.
a Uns senhores muito direitos, em cerimónias muito chatas, é isto protocolo? Pode parecer, mas não é. Na semana passada, a espanhola Nuria Martinez, 43 anos, especialista na matéria, veio à Faculdade de Letras de Lisboa explicar como a maioria das normas de bem-fazer - seja para cumprimentar, vestir, andar ou simplesmente estar - se destina, antes do mais, a facilitar a interacção entre os humanos.
São, no essencial, um conjunto de sinais de não agressão: mãos sempre à mostra, olhos nos olhos, respeito pelo espaço vital.
Como os habitantes do mundo animal precisam de espaço para se sentirem seguros, o respeito pelo espaço vital de um indivíduo é uma espécie de "marca de base" do protocolo. Média: um metro quadrado por pessoa é a média. É a medida dada como "boa" no Ocidente. No Médio Oriente, Itália e Grécia a tendência é para estreitar a barreira, enquanto na China ou no Japão esta se alonga até quase aos três metros.
Com mais ou menos espaço de permeio, a necessidade de uma distância de segurança pode ser assim comprovada: dê um passo na direcção do interlocutor e este, é quase sempre, dará outro para trás. É também um bom meio de chegar até à mesa das bebidas ou à janela sem ser preciso recorrer a interrupções antes do tempo.
A um metro do outro é possível observar não só o rosto, como as mãos. A três, as fontes de informação aumentam - pode ajuizar-se a colocação dos pés.
O protocolo, sublinha Nuria Martinez, que orienta os cursos nesta área do Instituto europeu Campus Stellae, em Santiago de Compostela, não vive de novidades.
Uma mão aberta significa, como sempre significou, um gesto de abertura para com o outro, de paz. Enquanto uma mão fechada, ou escondida, inquieta - seja ditado pela soberba ou pela timidez, é um sinal de fechamento, de vontade de não partilha.
Nestas mensagens ancestrais pode residir a resposta para aqueles momentos embaraçantes em que o corpo parece que sobra, com mãos e pés a mais. Que fazer com estes apêndices? Primeiro de tudo, não se deve forçá-los em posições "contra natura". Em pé, pernas direitas, pés ligeiramente afastados (mais nos homens, menos nas mulheres), procurando que o peso do corpo esteja bem distribuído pelas extremidades inferiores. Para procurar o "bom" ponto pode balançar ligeiramente para a frente e para trás. Depois fique direito, com os braços caídos e, para aguentar as mãos, cruze-as à frente (nunca atrás das costas).
Neste mundo concebido para destros, mandam as normas que a mão esquerda fique sobre a direita. Sem estar em contacto, a mão direita estará mais fresca e assim se evitarão esfregadelas apressadas ou embaraços de cumprimentos com mãos suadas.
Em situações mais descontraídas podem-se cruzar os braços à altura do peito, mas sempre com as mãos por cima ou seja, à mostra.
As coisas complicam-se, para as mulheres, quando é altura de sentar. O princípio é não chamar a atenção para os órgãos genitais. Por isso, os joelhos devem manter-se juntos.
Como só uma boa atleta conseguirá manter esta posição por longos períodos de tempo, é permitido cruzar ligeiramente os pés (um mantém-se apoiado no chão, direito, e o outro encosta por detrás).
Em ocasiões menos formais, podem-se cruzar as pernas, mas sempre com uma coxa por cima da outra. O joelho pode descolar do outro cerca de dois centímetros, criando a ilusão de umas pernas mais longas. Nestas circunstâncias, dependendo do tipo, uma cadeira pode ser a melhor aliada ou a pior inimiga.
Tudo por um bom aperto de mão Em protocolo, o cumprimento é rei.
A não ser entre amigos, o melhor é ficar-se pelo aperto de mão. É o mais generalizado e também aquele com menos problemas.
Os beijos, por exemplo, não só implicam uma maior proximidade física, como se corre o risco de ficar de cara esticada para o vazio. É o que acontece a quem dá dois beijos em sítios onde a norma é um (noutros locais dão-se três).
Já no que toca ao aperto de mão, dá-se um e acabou, embora existam alguns requisitos a respeitar para que aquele cumprimento possa cumprir plenamente a sua função de apaziguamento.
O primeiro de todos determina que não devem existir empecilhos a este mão com mão. São muitas as normas de protocolo concebidas expressamente para assegurar este livro acesso.
Algumas delas: o comprimento das mangas de camisas ou vestidos não deve ultrapassar o punho; as malas vão sempre do lado esquerdo (ao ombro ou, melhor ainda, escolher para ocasiões sociais umas pequena carteiras que possam ser transportadas na mão ou debaixo do braço esquerdo); todos os enfeites de usar ao peito (dos pins às condecorações) devem ser também à esquerda; e é com esta mão que se segura também o copo.
Pode-se sempre segurar por baixo um guardanapo, bem dobradinho entre os dedos mindinho e médio. Segundo Nuria Martinez, é outro bom truque para um aperto de mão bem sucedido. Deste modo tem-se sempre algo a que limpar a mão direita, a qual, por essas alturas, já terá levado uns croquetes e afins à boca do seu dono.
O segundo requisito para um bom cumprimento manda que as mãos se encaixem verdadeiramente. Nada de oferecer apenas as pontas dos dedos ou pousar uma palma mole na mão de outro.
Por fim, a mão na mão deve ser acompanhada de olhos nos olhos. É o chamado contacto visual. Atenção à luz! Quando esta é forte de mais, as pupilas contraem-se e esse é um sinal que provoca sempre uma reacção adversa. Está-nos no sangue. Esta transformação das pupilas num pequeno ponto acompanha as descargas de adrenalina provocadas por situações de medo ou agressão. Antecipam a fuga ou o ataque.
Perfumes à mesa, não.
Uma pessoa encharcar-se de perfume também constitui sempre uma agressão para os outros. E é mesmo proibido quando está em causa uma refeição: impede que se desfrute um dos grandes prazeres da mesa - o aroma dos alimentos.
Por muito que tente, o homem é incapaz de ir além de um determinado patamar de estímulos. Essa impossibilidade leva a que um perfume intenso seja também desaconselhado quando se vestem cores fortes ou trajes muito elaborados. Em conjunto provocam o que na gíria se designa de "saturação da imagem".
Quando um indivíduo é um conjunto de mensagens passível de ser decifrado, o rosto tem um peso de leão. Para evitar sofrimentos inúteis e os tiques consequentes, manda a prudência que em absoluto se evite estrear seja o que for (sobretudo sapatos) em casamentos, baptizados, recepções ou mesmo numa singela festa de amigos.
Não é só por um rosto contraído ser sempre um mau cartão de visita, mas também porque o desconforto interfere com a velha máxima, a que o protocolo não escapa, segundo a qual só se consegue estar bem com os outros quando se está bem consigo próprio.
Aquilo a que Nuria Martinez chama de "verdadeiro protocolo" será , pois, uma espécie de resposta "natural" às exigências da vida em sociedade.
A que se juntam marcas civilizacionais. Para ela, existem dois traços que constituem a sua marca de água: "generosidade e tolerância".
O primeiro manda que a atenção se vire para o outro, que se lhe dê tempo ( na memória perdurará sempre mais uma pessoa que sabe ouvir, do que uma tagarela). O segundo aconselha a evitar tiques de classe ou rejeições apressadas: "Devemos recordar-nos que quase tudo já foi correcto num determinado tempo".